O badalar dos sinos regula a vida de uma comunidade, organiza o tempo e age como promotor de limiaridades – processo ritual marcado pela suspensão dos elementos de vínculo social, estado de passagem ou transição que resulta em um novo ordenamento das funções sociais. A música dos sinos, neste contexto, opera em dois modos: um que expressa nuances de júbilo, alegria, euforia e outro que opera no âmbito da contrição, tristeza, luto. Esse binômio povoa a percepção coletiva e marca mudanças de comportamento social, (re)estruturam socialmente o tempo, ou ao menos atualizam normas e estruturas sociais no tempo. O presente acervo conta com o registro dos toques de sino nas cidades de Pirenópolis, Santa Cruz de Goiás, Pilar de Goiás, Cidade de Goiás e Jaraguá. Cidades goianas fundadas nos sec. XVII, pertencentes ao que convencionou-se nominar “ciclo do ouro”, marcado pela expansão “bandeirante” para o oeste brasileiro e a exploração do minério. Locais que passaram por um período de pujança econômica e forte urbanização devido à atividade mineradora, mas que entraram em “decadência” após ciclos relativamente curtos de exploração e um suposto esgotamento dos recursos minerais.

Além dos toques de sino, registramos – por meio de entrevistas – a fala dos atores/sujeitos/agentes relacionados ao toque dos sinos: sineiros, sineteiros, tocadores de sino, comunidade – suas memórias. Buscamos trazer narrativas dos próprios agentes sobre a atividade e seu entendimento sobre as dinâmicas culturais de suas comunidades, reflexões sobre a “patrimonialização” de seus modos de vida. A partir da variedade musical (rítmico-melódica) dos toques de sino somado ao conteúdo das falas registradas em entrevistas com sineiros, párocos, religiosos, procuramos esboçar um painel sobre a atividade dos sineiros e os toques de sino. O estímulo sonoro compreendido como marcador temporal, implica em reconhecer a importância de tal elemento no cotidiano dessas comunidades. Falar da história de um grupo de atores sociais implica em grande responsabilidade e, sobretudo, cautela frente à abordagem e ao tratamento dado à situação de pesquisa. Foi realizada uma pesquisa em música com reflexões sobre o patrimônio imaterial que desdobra-se em reflexões sobre a cultura popular e o patrimônio.

Achei incrível o trabalho sobre as identidades sonoras e a regulação dos modos cotidianos de vida de comunidades históricas. Estou desenvolvendo uma pesquisa que visa tratar das questões imagéticas ligadas a tradição da Semana Santa em Oeiras-PI, reconhecida até hoje como a capital da fé, apesar de a capital do Piauí ser Teresina a muitos anos.